quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Fernando Assis Pacheco

        Fernando Assis Pacheco nasceu em Coimbra em 1 de Fevereiro de 1937 e veio a falecer em Lisboa, na Livraria Buchholz ao início da manhã do dia 30 de Novembro de 1995. Tinha 58 anos. Foi poeta e cronista. Numa entrevista dada em 1978 apresentou-se assim: "Sou o Fernando Assis Pacheco, 41 anos, um pasmado sem cura. Tudo me espanta, gramo a vida, quero morrer mais lá para o verão". Aqui fica um poema para abrir o apetite...



O Poeta no Supermercado
 I
Indignar-me é o meu signo diário.
Abrir janelas. Caminhar sobre espadas.
Parar a meio de uma página,
erguer-me da cadeira, indignar-me
é o meu signo diário.

Há países em que se espera
que o homem deixe crescer as patas
da frente, e coma erva, e leve
uma canga minhota como os bois.
E há os poetas que perdoam. Desliza
o mundo, sempre estão bem com ele.
Ou não se apercebem: tanta coisa
para olhar em tão pouco tempo,
a vida tão fugaz, e tanta morte...
Mas a comida esbarra contra os dentes,
digo-vos que um dia acabareis tremendo,
teimar, correr, suar, quebrar os vidros
(indignar-me) é o meu signo diário.

II
Um homem tem que viver.
e tu vê lá não te fiques
- um homem tem que viver
com um pé na Primavera.

Tem que viver
cheio de luz. Saber
um dia com uma saudade burra
dizer adeus a tudo isto.
Um homem (um barco) até ao fim da noite
cantará coisas, irá nadando
por dentro da sua alegria.

Cheio de luz - como um sol.
Beberá na boca da amada.
Fará um filho.
Versos.
Será assaltado pelo mundo.
Caminhará no meio dos desastres,
no meio de miostérios e imprecisões.
Engolirá fogo.

Palavra,
um homem tem que ser
prodigioso.
Porque é arriscado ser-se um homem.
É tão difícil, é
(com a precariedade de todos os nomes)
o começo apenas.

     

Sem comentários:

Enviar um comentário